Alfredo Alves de Lima
Fiquei muito alegre em saber desta iniciativa de montarmos um breve compêndio sobre nossas lembranças individuais com nosso querido Murilo, a quem chamarei daqui em diante da mesma maneira como sempre me referi a ele: “Mú”.
Tive o grande privilégio de conhecê-lo aos doze anos, quando me mudei para seu apartamento na Rua Cristiano Viana com minha mãe, Ignez Whitaker, e minhas duas irmãs, Nina e Meméia. Foi durante esta época que conheci minha terceira “irmã”, a Carlota, filha única do Mú.
Desde então, ele foi sempre um grande pai para mim – de certa maneira muito mais presente e ativo do que meu próprio pai biológico. Sempre me incentivou, me apoiou, me fez rir, me deu dicas, me surpreendeu e me amou – claro, à sua maneira absolutamente única e especial.
Adorava acordar de manhã e tomar café com ele, saborear um suco de laranja sempre super fresco, um pão com manteiga crocante com um boa dose de manteiga e um cafezinho bem escuro – sempre acompanhado de seus jornais e revistas. Adorava também ouví-lo tocar piano, o qual ficava no segundo andar de seu charmoso duplex.
Após algum tempo, nos mudamos para uma lindíssima casa na Rua Santo Antonio, no bairo do Bixiga, que minha mãe acabara de comprar e restaurar. Esta fase também foi marcada por muitos momentos alegres, dentre os quais sobresai a mudança de meu irmão Antonio Manoel, que havia deixado a casa de meu pai no Morumbi para vir morar conosco. Para melhorar, nossa família expandida contava agora também com as frequentes visitas de nossa querida Carlota.
Na casa da Rua Santo Antonio, tenho dois grandes momentos dos quais me recordo com especial carinho: O primeiro eram as nossas refeições, sempre populosas e muito animadas, que o Mú oportunamente enriquecia com seus comentários breves porém altamente perspicazes e contundentes. O segundo, quando Mú e eu, apenas nós, nos dirigíamos para a sala de TV para assitir filmes de faroeste. Costumávamos conversar sobre tudo ao mesmo tempo em que ele assitia ao filme, lia seus jornais e fazia caricaturas, arte esta que ele dominava com especial primor e requinte, mesmo que feitas em uma mera folha de guardanapo ou no próprio jornal. (Que pena que nunca guardei nenhuma delas!!!)
Depois, quando fui estudar em Nova York, minha amizade pelo Mú se estreitou ainda mais. Saíamos sempre juntos, acompanhados de minha mãe e minha então namorada e atual mulher Patricia. Nosso principal programa era visitar lojas de som, das mais simples às mais sofisticadas. Apesar de sua total fluência, ele não costumava se expor ao idioma, fazendo com que eu desempenhasse o papel de intérprete.
Durante a época em que trabalhava no Republic National Bank, ao lado da biblioteca na 5a avenida, o Mú vinha sempre almoçar comigo. Ele adorava também ir à loja Barneys para procurar por sapatos e gravatas.
Depois de muitos anos, quando voltei ao Brasil, continuei muito próximo ao Mú. Sempre nos falávamos por telefone ou íamos visitá-lo em seu apartamento na Rua Piauí antes de sairmos para jantar – muitas vezes no restaurante Arábia. Ele adorava minha mulher Patricia e achava profunda graça em meus três filhos, Julita, Pedro e Lucas.
Me recordo de um episódio um tanto “Murilesco”, quando eu e minhas irmãs havíamos combinado de sair com ele para jantar. Subimos ao seu apartamento, conversamos um pouco e enfim descemos. Quando já estávamos no ponto de taxi na Praça Buenos Ayres prestes a adentrar o carro, o Mú nos olhou e disse que não estava mais com vontade de sair. Simplesmente nos deu um carinhoso beijo e começou a caminhar de volta rumo ao seu prédio. Mesmo que de certa forma surpresos como o repentino “abandono”, rimos muito, pois sempre compreendemos e de fato admirávamos a sinceridade e a legitimidade de seus atos.
Enfim, são estas algumas das inúmeras lembranças alegres que tenho do nosso querido Mú. A última da qual me recordo com particular prazer ocorreu num domingo recente, pouco antes de seu falecimento, quando fomos tomar um brunch no Café Suplicy. Estava confidenciando a ele uma experência ruim e triste que havia tido com meu pai. Logo que acabei de “descarregar” toda minha indignação sobre o comportamento de meu pai, o Mú me olhou sobre a folha do jornal e disse” “Tá certo, Alfredo, seu pai fez a coisa certa!”. Ele, mais uma vez, com seu jeito único, sereno e sobretudo enfático, me fez rir, me surpreendeu e, acima de tudo, me desarmou por completo.
Mú – obrigado por tudo, por seu carinho, por sua sabedoria, por sua sempre deliciosa companhia. Sinto muitas saudades de você, de nossas risadas, de suas fofocas, de seu talento, de seu senso de humor, de escutar música com você e, sobretudo, de sua torcida. I will miss you forever.
Much love….
Alfredo (vulgo “Anjo”)
quinta-feira, 7 de agosto de 2008
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