quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Triste

Monja Coen

Fico me lembrando de sua figura esbelta e pálida, sempre carregando um guarda-chuvas, mesmo nos dias de sol.

Quando fui pedir emprego no JT, isso nos idos de 1968, ele me recebeu em sua sala. Fui poucas vezes a sua sala, talvez umas duas ou três vezes durante todo o pouco tempo (menos de três anos) em que trabalhei no JT.

Aprendi a respeitá-lo e de certa forma temê-lo. Por que? Eu não saberia dizer.

Depois de meses como estagiária, éramos três meninas - Murilo se inspirara nas meninas do JB do Rio - um dia tomamos coragem e fomos falar com ele. Eu estava muito nervosa, com vinte e um anos de idade, sem nenhuma experiência empregatícia, ter de ir falar com alguém se me contratava ou não pois estava chegando no pico do meu estresse.

Ele ouviu, sorriu, levantou os olhos e disse : “Mas vocês estão sendo contratadas este mês.”

Alguns meses mais tarde tivemos censura no jornal. E quanto todos nós repórteres decidimos fazer greve contra a censura, Murilo ficou com Dr. Rui e talvez mais uma ou duas pessoas e fecharam juntos todo o jornal.

Há alguns poucos anos, telefonei para ele. Murilo estava no JT novamente. Talvez fosse no ano 2000? Não pude ir.

Fiquei na saudade.

Havia em sua vida um piano. Será que eu o ouvi tocar, que o vi tocar um piano de cauda, negro?

Ou serão apenas fragmentos de memória perdidos nas histórias que me contavam?

Saudades do seu sorriso, da pele clara, dos dedos longos e da inteligência brilhante que parecia ver através de cada um de nós.

No meu caminho a passagem pela redação do JT, chefiada por ele, foi essenciall para a abertura de consicência da realidade e para minha transformação, hoje, em monja zen budista.

Profundos agradecimentos. Murilo Feliz berto.

Descanse em paz. Missão cumprida.

Formou jornalistas, formou pessoas, formou seres humanos integros e bons através de seu exemplo, de sua vida, manifesta em seu andar, seu olhar, sua fala mansa, baixa, firme, correta. Valeu.

Sempre indo, indo, tendo ido e já tendo chegado.

Na Terra Pura dos seres iluminados.

Mãos em prece
Monja Coen
(naqueles tempos Claudia Batista)

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